Escala cultural :: Sense8

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Sense8 é uma série nova do Netflix, lançada em junho, escrita e dirigida pelos irmãos Wachowski (que também fizeram nada mais nada menos que a trilogia Matrix). Há quem ame, há quem odeie. Já declaro que sou do primeiro time e que desde Lost não ficava tão empolgada com uma série. Ok, teve Breaking Bad, mas foi diferente.

Assim como Lost, Sense8 me impactou por mexer com muitas sensações diferentes. Tem humor, ação, suspense, romance, reflexões e aborda temas como moral, sexualidade, autoestima, aceitação e medo – para resumir bem. A história é sobre oito pessoas que passam a se conectadar mental e emocionalmente e a sentir as sensações uns dos outros, podendo inclusive intervir, conversar e apoderarem-se das habilidades e conhecimentos uns dos outros, como se os oito passassem a ser um só.

E o que a série tem a ver com viagem? É que cada um dos oito protagonistas vive em um canto do mundo, de forma que quem assiste acaba viajando e conhecendo um pouquinho de cada lugar. Aliás, as filmagens foram feitas nas próprias cidades retratadas. Para embarcar na viagem, dá só uma olhada na abertura linda da série:

Já deu para sentir um pouquinho a sensação de viajar né? A abertura é tão fodástica que uma galera se dedicou a listar os 108 lugares que aparecem nela! Agora que já tivemos a introdução, vamos a uma breve apresentação de cada personagem e o seu destino correspondente:

Will Gorski – Chicago (EUA)

Will e vista aérea de Chicago. Fotos: Divulgação e Choose Chicago

Will e vista aérea de Chicago. Fotos: Divulgação e Choose Chicago

Quem é: O policial é um dos elementos centrais da trama, pois é ele quem começa a ter um pouco mais de noção do que está acontecendo ce diferente e passa a investigar sobre o que é ser um sensate (como são chamados os que desenvolvem essa ultra sensibilidade e conexão).

Ator: Brian J. Smith. Trailer do personagem no youtube.

Conflitos: Além de ter tido uma relação conflituosa com seu pai, também policial, vive assombrado pela a memória de um assassinato que aconteceu durante sua infância.

Destino: O skyline de Chicago aparece em vários momentos, mas há duas cenas mais marcantes: uma é quando Will celebra o dia da Independência dos Estados Unidos (em 4 de julho) e assiste a uma queima de fogos de um barco, ao lado do seu pai, no próprio rio Chicago. Outra é quando se depara com uma visão na Crown Foutain, um espelho d’água com dois painéis gigantes que projetam fotografias no Millennium Park.

Riley Blue – Londres (Inglaterra) + Reykjavík (Islândia)

Riley e vista aérea de Reykjavik do alto da igreja Hallgrímskirkja. Fotos: Divulgação e Christine Zenino/Creative Commons

Riley e vista aérea de Reykjavik do alto da igreja Hallgrímskirkja. Fotos: Divulgação e Christine Zenino/Creative Commons

Quem é: Uma DJ islandesa que vive em Londres. É bem introspectiva e misteriosa, sempre curtindo um som e fumando haxixe. Sua trajetória na primeira temporada é dividida entre Londres e Reykjavik.

Atriz: Tuppence Middleton. Trailer da personagem no youtube.

Conflitos: Ela se mete em umas confusões por conta de drogas e más companhias, mas o buraco é bem mais embaixo. Mais para frente os conflitos mais íntimos ligados ao seu passado e sua família vão sendo revelados.

Destinos: Assim como Chicago, o skyline de Londres também aparece em belas cenas noturnas. Outros pontos conhecidos como a Millennium Bridge também dão as caras. Mas é na Islândia que são feitas as cenas mais bonitas da série, na minha opinião. Não consegui identificar os lugares, mas as paisagens são sensacionais: aparecem montanhas cobertas de neve, praia cercada de pedras, uma caverna e toda a graciosidade da capital Reykjavik e suas casinhas coloridas.

Nomi Marks – San Francisco (EUA)

Nomi e o Dolores Park, em San Fran. Fotos: Divulgação

Nomi e o Dolores Park, em San Fran. Fotos: Divulgação e sfrecpark.org

Quem é: Tanto a personagem quanto a atriz que a interpreta são transexuais. Nomi é uma hacktivista (hacker ativista) e vive com sua namorada e companheira fiel Amanita.

Atriz: Jamie Clayton. Trailer da personagem no youtube.

Conflitos: Sua família não aceita sua mudança de sexo, já começa por aí. Piora quando acaba no hospital por conta de um acidente e é obrigada pelo medico e por sua mãe a fazer uma operação arriscada sem direito a escolha ou mais informações.

Destino: O lado gay de San Francisco aparece com força na série, até para ambientar bem o casal Nomi e Amanita. Uma das cenas mais legais é quando elas vão à Parada do Orgulho Gay da cidade, ou em um dos flashbacks em que aparece o Dolores Park com a galera toda deitada no gramado, bem no clima de liberdade que a cidade parece ter.

Capheus Van Damme – Nairóbi (Quênia)

Capheus e o trânsito caótico de Nairóbi. Fotos: Divulgação

Capheus e o trânsito caótico de Nairóbi. Fotos: Divulgação e rogiro/Creative Commons

Quem é: Motorista de uma van chamada “Van Damme”, é um dos meus personagens favoritos pelo alto astral e extrema bondade, mesmo em meio às dificuldades financeiras, violência e “gente do mal”.

Ator: Aml Ameen. Trailer do personagem no youtube.

Conflitos: Ele vive em busca de ganhar dinheiro para conseguir comprar os remédios para sua mãe, que é soropositiva. E para isso, acaba passando por situações tensas e extremas.

Destino: Acho que é o único da lista que não é explorado turisticamente. A abertura da série mostra mais a parte caótica do trânsito de Nairóbi e imagens de animais e paisagens naturais que nem aparecem nos episódios. É complicado, porque o que tem de mais turístico acaba sendo os safáris. Mas achei legal que tem um destino africano na lista. Adorei uma hora que perguntam onde ele vive e ele responde “Nairóbi”, e a outra pessoa pergunta “na África?” e ele ri e diz “Não, no Quênia”, dando uma zuada nesse esteriótipo de África.

Sun Bak – Seul (Coreia do Sul)

Sun e o Templo Bongeunsa, em Seul. Fotos: Divulgação e Evan Chu/Creative Commons

Sun e o Templo Bongeunsa, em Seul. Fotos: Divulgação e Evan Chu/Creative Commons

Quem é: Empresária de dia, lutadora de Kickboxing à noite. Brincadeira, mas é mais ou menos assim que eu definiria a Sun, que parece ter duas vidas mesmo: uma em que ela se contém e engole um monte de coisas à contragosto e outra que ela se solta e põe tudo para fora.

Atriz: Doona Bae. Trailer da personagem no youtube.

Conflitos: Ela prometeu à sua mãe, em seu leito de morte, que cuidaria do seu pai e do seu irmão. No entanto, os dois são super machistas e impedem seu crescimento na empresa da família, entre outras coisas mais tensas.

Destino: A série mostra também dois lados de Seul: um mais moderno, com arranha-céus espelhados, e outro mais tradicional, com parques e templos budistas. Mas infelizmente não é um destino muito explorado como os outros nas cenas em que Sun aparece. Senti falta =/

Lito Rodriguez – Cidade do México (México)

Lito, el Caído e o Museo Diego Rivera Anahuacalli. Fotos: Divulgação e Omar Bárcena/Creative Commons

Lito, el Caído e o Museo Diego Rivera Anahuacalli. Fotos: Divulgação e Omar Bárcena/Creative Commons

Quem é: “Lito, El Caído” é o codinome desse ator mexicano de sucesso, galã, estrela de vários filmes de ação e… gay. Leva uma vida dupla: frequenta festas com modelos lindas, mas chega em casa e se entrega para o namorado.

Ator: Miguel Ángel Silvestre. Trailer do personagem no youtube.

Conflitos: Sair do armário e assumir o namorado ou manter as aparências para não prejudicar sua carreira? Imagino que o México não seja lá um país muito gay friendly. É mais conservador e talvez o público das novelas e filmes mexicanos não seja aberto para aceitar a homossexualidade de um de seus principais astros.

Destino: Exceto pela abertura de Sense8, as atrações da Cidade do México não aparecem com tanta frequência. Como Lito é ator, a maioria das cenas é feita nos sets de filmagem ou no próprio apartamento em que vive com seu namorado. Mas há um momento especial, em que Lito está no Museo Diego Rivera Anahuacalli (foto) observando um mural do próprio Rivera e tem um diálogo incrível (o melhor da série para mim) sobre aceitação com a Nomi.

Wolfgang Bogdanow – Berlim (Alemanha)

Wolfgam e o Memorial ao Holocausto, em Berlim. Fotos: Divulgação e Creative Commons

Wolfgang e o Memorial ao Holocausto, em Berlim. Fotos: Divulgação e Márcio Cabral de Moura/Creative Commons

Quem é: Mais um com vida dupla na turma. Oficialmente, Wolfgang é serralheiro, mas também é arrombador de cofres profissional. Ao longo da série vemos que sua infância e adolescência foram bem difíceis e o tornaram mais durão.

Ator: Max Riemelt. Trailer do personagem no youtube.

Conflitos: Tem um passado tensíssimo com seu pai, que o tratava muito mal, e hoje tem que lidar com seu tio e primo, que o perseguem após o roubo do cofre da família. Se contar mais estraga, então fica aí o mistério.

Destino: Apesar de vermos o personagem em muitas cenas de ação, a série mostra também seu lado boêmio. Ele curte bastante a vida noturna de Berlim e aparece relaxando em saunas e piscinas da cidade. O lindo skyline da capital alemã embeleza várias trocas de cenas, mas o Memorial ao Holocausto (foto) é a atração mais marcante de Berlim no seriado, servindo de cenário para um encontro importante.

Kala Dandekar – Mumbai (Índia)

Kala e as ruas de Mumbai tomadas pela festa a Ganesh. Fotos: Divulgação e sandee pachetan/Creative Commons

Kala e as ruas de Mumbai tomadas pela festa a Ganesh. Fotos: Divulgação e sandee pachetan/Creative Commons

Quem é: Kala é uma farmacêutica de Mumbai, orgulhosa de sua profissão, devota de Ganesh e está prestes a se casar.

Atriz: Tina Desai. Trailer da personagem no youtube.

Conflitos: A família e as amigas aprovam o casamento, só que ela não ama o futuro marido. Vive questionando se deve ser casar ou não, afinal, o cara é um bom partido, rico, todo mundo gosta dele e é apaixonado por ela.

Destino: Talvez por ser um destino com uma cultura mais diferente da ocidental, a Índia ganhou bastante espaço na série. Há uma cena de dança no melhor estilo de Bollywood, uma mega produção, outra parte em que mostra Mumbai durante a festa de Ganesh (foto) e o templo hindu frequentado por Kala também é um cenário frequente. Acho que é o lugar em que mais temos a sensação de imersão durante a série.

***

Se interessou? Então para começar a aquecer para a maratona de episódios (são 12 desta primeira temporada), veja uma das cenas mais bonitas da série – e a primeira vez que os oito sensates (como são chamados) se conectam ao mesmo tempo. Não tem spoiler e não estraga a surpresa, fique tranquilo – no meu caso, foi esse vídeo que me fez querer ver a série ❤

Escala cultural :: Série Pan Am

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Aparecia direto no Netflix uma imagem de quatro aeromoças de azul, uniforme retrô e o título “Pan Am” – a mítica companhia aérea dos Estados Unidos. Vi que tinha a Christina Ricci (pra mim, a eterna Vandinha da Família Adams) e me animei a ver, achando que era um filme. Melhor: é uma série!

Exibido entre 2011 e 2012, o programa durou apenas uma temporada de 14 episódios porque não rendeu audiência. De fato, “Pan Am” não teria como se destacar muito frente a tantas séries dinâmicas e com enredos ricos que vêm sendo feitas. Tem outro ritmo e o suspense é pouco. O jornal The Guardian acho que resumiu bem: Mad Men With Wings (Mad Men com asas), por também abusar da nostalgia, já que se passa nos anos 60.

O que não quer dizer que não vale a pena assistir! Vi todos os episódios e fiquei com gostinho de quero mais. Por isso achei bacana contar um pouco do que é a série:

O que é a Pan Am?

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Foi a maior companhia aérea dos Estados Unidos até 1991, quando encerrou as atividades. Começou a operar em 1927, com voo inaugural de Key West para Havana (quem diria!). Em seguida, começou a expandir para todo o continente, dominando o mercado latino americano, com voos para Buenos Aires e Rio de Janeiro.

Nos anos 70, chegou a atender mais de 150 países e estava presente em todos os continentes (exceto a Antártica), mas com a crise do petróleo em 1973 começou a decair. Chegou até a sofrer um ataque terrorista em 1988, quando uma bomba explodiu um de seus aviões. Dali em diante passou a vender rotas e aeronaves às concorrentes Delta e United Arlines até a sua falência.

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Prédio da Pan Am em Nova York. Foto: Acervo Pan Am

Sinopse da série

O seriado se passa em 1963, ou seja, a era de ouro dos Estados Unidos. Nessa época o sonho americano estava no auge e o mundo todo começava a seguir as tendências de moda, música e comportamento do país. A série “Pan Am” acompanha a equipe que faz o primeiro voo Nova York-Londres em um jato, chamado de “Clipper” pela empresa.

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Os protagonistas são as quatro aeromoças, o capitão e o primeiro piloto desse voo. Vamos apresentá-los: Maggie, comissária mais experiente, irreverente e politizada; Colette, francesa que perdeu os pais durante a Segunda Guerra; Kate, que começa a ser espiã do governo americano; e Laura, sua irmã, que abandonou o noivo no altar para viver a aventura de ser uma comissária de bordo. Dean estreia como capitão neste voo e sonha em se casar com uma aeromoça misteriosa que desaparece da empresa, e Ted, o co-piloto, vive frustrado por não ser o capitão.

O enredo mescla bem romance com um pouco de ação, graças a turbulências e outros imprevistos dos voos, mas principalmente graças a Kate, a aeromoça-espiã. A cada episódio ela tem que cumprir uma missão e isso gera uma certa tensão no ar.

O que tem de bom?

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Para quem gosta de viajar, é comum já ter sonhado em ser piloto de avião ou aeromoça. A série foi feita para atiçar ainda mais essa vontade, porque mostra bastante o glamour dessas carreiras na época. O status de ser uma comissária nos anos 60 era altíssimo: elas viajavam o mundo, eram independentes e acabaram se tornando símbolos sexuais dessa geração, pois eram lindas, elegantes e estavam sempre em forma – o que era até um pré-requisito, como mostram algumas cenas da série, quando as mulheres eram obrigadas a se pesar sempre antes de embarcar (!).

“Pan Am” inclui um pouco dos bastidores das aeromoças e dos pilotos na trama – com uma certa dose de romantismo também, é claro. Os episódios trazem à tona os jogos de poder para virar um piloto, as conversas das aeromoças enquanto estão na “copa” do avião, os perrengues com passageiros encrenqueiros, o que acontece quando tem uma turbulência ou emergência, e até situações desagradáveis, como quando uma das aeromoças encontra seu namorado no avião e descobre ali mesmo que ele é casado e tem filhos.

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O contexto histórico é outro ponto interessante da série, que retrata os Estados Unidos em plena Guerra Fria. Há cenas em Cuba, em Berlim e na Rússia e referências ao presidente Kennedy, que governava o país na época. Apesar de o foco não ser esse, os acontecimentos históricos se integram bem à trama.

Para quem curte uma sessão nostalgia, vai adorar se transportar para a série, se imaginar nos anos 60 e observar as diversas mudanças que ocorreram no estilo de viajar nesses anos. Os uniformes das comissárias, a rotina de um voo, as bagagens, o espaço entre os assentos, as refeições e permissões (como fumar à bordo) são diferentes, sim. Mas para quem viaja nada disso importa. O que vale mesmo é a sensação de liberdade ao voar e esperar um mundo novo aparecer na janelinha – e é isso que a série consegue provocar.